Por
Angela Vauthier
Quem nunca se sentiu sozinho mesmo estando em família
ou entre amigos? Quem nunca se sentiu o menor diante de um grupo de pessoas
capacitadas? Quem nunca se viu precisando de um ombro amigo pra chorar e
dividir as tristezas e frustrações e muitas vezes teve que chorar sozinho
porque não encontrou ninguém que pudesse ajudar?
Fomos criados para vivermos em sociedade e uma das
coisas que nos alegra e complementa a vida é a amizade. De acordo com o
dicionário, Amizade – s. f.Afeição, estima, dedicação recíproca entre pessoas do mesmo sexo ou de
sexo diferente: laços de amizade. Sentimento de quem é amigo. Amor. Dedicação.
Benevolência.
Estamos vivendo num mundo globalizado, onde o avanço
da internet tem facilitado a comunicação entre as pessoas que estão distantes
geograficamente aproximando-as cada vez mais, porém ironicamente também tem
afastado as que estão próximas já que se perde tanto tempo conectado conversando.
O resultado disso tem sido a mudança de comportamento das pessoas, alguns
passaram a se isolar no mundo real para viver apenas no virtual; outros querem
trazer do mundo virtual vocabulários e comportamentos para o mundo real; alguns
se tornaram tão fissurados que tudo o que pensam ou fazem tem como finalidade
expor na internet; há ainda aqueles que passam uma imagem de superioridade no
mundo virtual, de muita ostentação, mas que não passa de utopia para
impressionar a quem tiver acesso; e também existem aqueles dramáticos, que
adoram chamar atenção, fazendo-se de coitadinho para que a sua carência afetiva
possa ser suprida.
Não podemos
esquecer de falar de como hoje está tão vulgar o verdadeiro valor e sentido do
que é ser amigo. Com as redes sociais (Orkut, Facebook, Twitter e etc.), a
facilidade de se fazer amizade é enorme. Para alguns quanto maior o número de
“amigos” em seu perfil, melhor, como se isso fosse um troféu, pois mostra o
quanto essa pessoa é popular.
Há aqueles que se comunicam todos os dias com os
amigos na internet e quando os encontra pessoalmente nem sabe quem são, não dá
atenção, para eles o amigo é um estranho. Há outros que mal foram aceitos num
perfil de rede social já se acham íntimos o suficiente para proclamar aos
quatro ventos que é amigo daquela pessoa e até se acham no direito de invadir a
privacidade alheia. E há ainda aqueles que só procuram ter e/ou manter uma
amizade quando o outro tem algo que ele possa usufruir: dinheiro, status,
amigos influentes, etc. E quando isso se acaba a amizade vai junto.
Bem diferente da maneira simples e pura que as
amizades nasciam antigamente: vizinhos que cresciam juntos e praticamente se
tornavam uma família; colegas de classe que ao longo dos anos a amizade ia se
fortalecendo e em alguns casos terminava até em casamento; colegas de trabalho
que a amizade ultrapassava os limites da empresa...
Enfim, quando alguém abria a boca para dizer que era
amigo de alguém é porque tinha intimidade tamanha a ponto de conhecer gostos,
costumes, partilhar momentos bons e maus e o mais importante, estar à
disposição para ouvir e ajudar quando um amigo estivesse passando por
problemas.
A Bíblia nos fala a respeito de um jovem que sofria
rejeição em seu lar por seu pai e seus irmãos. Não era tido como forte, valente
ou formoso aos olhos, não tinha perspectiva de no futuro se tornar um soldado
do rei, já que a sua função era cuidar das ovelhas da família para delas trazer
o sustento de casa. Assim era a vida de Davi.
Em I Samuel 16, vemos o relato de como o Senhor
direcionou o profeta Samuel até a casa de Jessé para que lá ele pudesse
consagrar o novo rei de Israel. Com o olhar estratégico de que a nação
necessitava de um rei que defendesse o seu povo dos inimigos que guerreavam
contra eles, qualquer um aceitaria a ideia de consagrar um dos filhos de Jessé
que eram soldados do rei Saul, inclusive o próprio Jessé fez questão de
apresentá-los ao profeta por acreditar que eram capazes de assumir tal posição.
Mas como o Senhor mesmo falou ao profeta: “... Não considere sua aparência nem sua
altura, pois Eu o rejeitei. O Senhor não vê como o homem, o homem vê a
aparência, mas o Senhor vê o coração”.
Ao ver que todos os filhos de Jessé haviam sido
apresentados e reprovados pelo Senhor, Samuel procura ver se ainda restava uma
chance de encontrar naquela casa o escolhido pelo Senhor, afinal, ele estava
ali porque tinha certeza da determinação do Senhor. É quando se fala de maneira
tão desprezível que ainda tinha o caçula mas que estava cuidando das ovelhas.
Lógico que essa atividade não poderia ser comparada com a de seus irmãos. Como um pastor de ovelhas poderia conhecer os
armamentos de guerra e suas utilidades? Qual o preparo físico e tático Davi
tinha para entrar numa batalha e como reconhecer as estratégias do inimigo se o
seu mundo se resumia apenas ao balido das ovelhas, o barulho das correntezas
das águas, o aroma das plantas e a sabedoria de guiar o seu rebanho para
lugares seguros?
E o que tinha de interessante para contar ao chegar em
casa depois de um dia de trabalho? Que salvou uma ovelha de cair no abismo, ou
a livrou de um animal feroz, ou ainda que a limpou dos carrapichos que estavam
agarrados em seu corpo? Bem diferente de ouvir as grandes aventuras que seus
irmãos tinham para contar ao voltar das vitoriosas batalhas com o rei Saul.
Com certeza Davi conseguia superar essa rejeição e
encontrava refúgio quando em seu labor com as ovelhas sentava-se na relva e
começava a tocar a sua harpa e compor suas belas canções de exaltação ao
Senhor. Ali ele podia ter a certeza que era amado, compreendido, aceito e não
precisava se sentir inferior. E era ali que Davi tinha o seu momento de
comunhão com Deus.
Porém o Senhor em tudo tem um propósito em nossas
vidas. Davi passou por tudo isso porque um rei não precisa ter apenas o
conhecimento tático para defender seu povo, um rei precisa ter um coração
amável para saber cuidar de seu povo de maneira justa e agradável. E Davi
enquanto cuidava das ovelhas passou por esse aprendizado, pois ele precisava
trazer para o seu reinado o mesmo cuidado que ele tinha com as suas ovelhas.
Embora ele não fosse querido entre os seus irmãos, e
com certeza perseguido, sem direito de se expressar ou opinar, a prova está em
I Samuel 17: 28-29 onde lemos: “Quando Eliabe, o irmão mais velho, ouviu
Davi falando com os soldados, ficou muito irritado com ele e perguntou: ‘Por
que você veio até aqui? Com quem deixou aquelas poucas ovelhas no deserto?
Sei que você é presunçoso e que seu
coração é mau; você veio só para ver a
batalha’. E disse Davi: ‘O que eu fiz agora? Será que não posso nem mesmo
conversar?’ ”; Deus lhe deu um grande presente: a amizade de Jônatas.
Em I Samuel 18:1-4 A Bíblia nos diz: “Depois
dessa conversa de Davi com Saul, surgiu tão grande amizade entre Jônatas e Davi
que Jônatas tornou-se o seu melhor amigo. Daquele dia em diante, Saul manteve
Davi consigo e não o deixou voltar à casa de seu pai. E Jônatas fez um acordo
de amizade com Davi, pois se tornara o seu melhor amigo. E Jônatas tirou o
manto que estava vestindo e o deu a Davi, com sua túnica, e até sua espada, seu
arco e seu cinturão”.
Com certeza os irmãos de Davi deviam se questionar por
que Jônatas agia assim com Davi e nunca agiu com eles antes. A inveja devia
estar pairando em seus corações, afinal, Davi sempre foi um simples pastor de
ovelhas, qual tipo de vivência ele tinha em comum com Jônatas para ter uma
amizade tão sólida como essa?
Mas os planos de Deus não são os nossos. Como Davi
poderia se familiarizar com os costumes e rituais de um palácio real se ele não
tivesse livre acesso ao ambiente? Como poderia saber se portar à mesa, na sala
real, no trato com os empregados e até mesmo nas decisões que eram julgadas ao
serem trazidas ao rei se ele estivesse apenas limitado ao convívio dos soldados
treinando para as guerras? Todo o tempo que Davi passou entre a sua consagração
até assumir de fato e de direito o trono de Israel foi um preparo do Senhor em
sua vida, como um diamante sendo lapidado, ele esperou pacientemente e enquanto
esperava não perdia a oportunidade de aprender tudo o que iria precisar para
ter um reinado bem sucedido. E claro que tudo isso lhe foi permitido por causa
de sua amizade com Jônatas.
Esse é um exemplo belíssimo de amizade sincera
e que se manteve a lealdade, mesmo quando um deles já havia partido. Davi e
Jônatas eram amigos leais e firmaram um compromisso de se protegerem bem como
aos seus familiares mesmo se um deles morresse. Em I Samuel 20:23 nos diz: “Quanto
ao nosso acordo, o Senhor é testemunha entre mim e você para sempre”. Jônatas
morreu numa batalha e o seu filho Mefibosete ficou órfão e foi criado por sua
ama que fugiu com ele ao saber da morte do rei Saul . Quando Davi finalmente
assumiu o trono não demorou muito para por em prática o que havia prometido:
procurou saber se ainda restava vivo alguém da casa de Jônatas e não apenas
devolveu toda a propriedade que era de direito de Mefibosete, como o fez
sentar-se à sua mesa tornando-o membro da família real. Talvez algumas pessoas
atualmente não tomassem essa mesma atitude, afinal, só quem sabia desse pacto
eram eles dois e Jônatas estava morto, mas Davi era íntegro e temente a Deus e
tinha certeza que o Senhor tinha visto quando ambos fizeram o juramento, pois
de Deus ninguém se esconde e nada fica oculto.
Essa é a prova de que um amigo não é apenas para estar
presente nos momentos de alegria, de festa, mas amigo é para socorrer nos
momentos de tristeza, necessidade e sufoco. Ser amigo é não olhar posição, mas
a real necessidade do outro.
Não podemos esquecer
da atitude de Jônatas ao trocar suas vestes com Davi, foi a prova de que
diante do Senhor somos todos iguais e que ninguém é superior, mas
principalmente que não devemos deixar que barreiras nos separem, e nosso caso,
as denominacionais.
E quem vai cuidar do Pastor? Quem pode lhe dar atenção, chorar com ele,
ouvir seus problemas e suas queixas? Quem pode dividir com o pastor as suas
cargas? Quem poderá lhe oferecer um ombro amigo? Da mesma maneira que Davi
encontrou em Jônatas um amigo leal que lhe proporcionou crescimento para a sua
vida como rei, espero que cada Pastor, cada Davi espalhado nesse mundo,
encontre o seu Jônatas para que no decorrer de sua caminhada espiritual e
pastoral, possa ter o apoio necessário, uma amizade leal, não levantando a
bandeira de sua denominação, mas entendendo que como Corpo de Cristo precisamos
viver a unidade que o Senhor Jesus pediu em Sua oração sacerdotal: “...
para que sejam um, assim como somos um”. João 17:11.
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